Dois mil brasileiros participarão dos testes de uma vacina contra a Covid-19 desenvolvida pela Universidade de Oxford. A estratégia faz parte de um plano de desenvolvimento global no qual o Brasil será o primeiro país fora do Reino Unido a começar a testar a eficácia da imunização contra o Sars CoV-2.
O procedimento foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) com apoio do Ministério da Saúde. Em São Paulo, os testes serão realizados em 1.000 voluntários pelo Centro de Referência Especial em Imunologia (Crie) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A Fundação Lyman está financiando as estruturas e equipamentos médicos da operação.
Os voluntários estarão na linha de frente da luta contra o coronavírus e têm maior probabilidade de serem expostos ao SARS CoV-2. Nem podem ser infectados em outros momentos. Os resultados são importantes para a compreensão da segurança da vacina.
Reino Unido começou a testar
Uma vacina desenvolvida na Universidade de Oxford com previsão otimista de estar pronta até 2020 forneceu proteção em um pequeno estudo com seis macacos, resultado que levou a testes em humanos a partir do final de abril.
Em humanos, o teste tem apenas 50% de chance de sucesso. Adrian Hill, diretor do Oxford Jenner Institute, que está trabalhando com a AstraZeneca para desenvolver a vacina, disse que os resultados nesta fase, envolvendo milhares de voluntários, podem não garantir que as imunizações sejam eficazes e pediu cautela.
A vacina foi administrada a 10.000 voluntários no Reino Unido. A dificuldade em provar a possível eficácia é que os cientistas contam com a disseminação contínua do vírus na população para que os voluntários sejam expostos ao coronavírus Sars-Cov-2.
A cientista Daniela Ferreira, doutora pelo Instituto Butantan, coordenou um centro em Oxford para testar a vacina e trabalhou para que o esforço não fosse em vão, acabando no fundo de um freezer de laboratório.
“É um pouco estranho porque você quer que o coronavírus desapareça, não quer que a infecção permaneça”, disse o chefe do departamento de ciências clínicas da Escola de Medicina Tropical de Liverpool.
Outras vacinas estão a caminho
Segundo relatório publicado no site da Organização Mundial da Saúde (OMS), até esta terça-feira (2), há pelo menos 133 vacinas candidatas em desenvolvimento, sendo que 10 delas estão em fase clínica, ou seja, testes em humanos.
Embora a pesquisa esteja avançando globalmente, muitos especialistas acreditam que a vacina não estará disponível em 2020. A previsão otimista é de 12 a 18 meses, o que já é um recorde. A vacina mais rápida de todos os tempos, a vacina contra caxumba, levará pelo menos quatro anos para ficar pronta.
Outra hipótese com a qual todos os pesquisadores estão lutando é que uma vacina eficaz e segura nunca foi encontrada. O vírus HIV que causa a AIDS é conhecido há cerca de 30 anos, mas sua constante mutação nunca permitiu uma vacina.
“Todo mundo está muito otimista, mas a pesquisa de vacinas é uma coisa muito complicada. A maioria está parada na fase 3 dos ensaios clínicos por problemas que surgem. É importante discutir essa possibilidade (sem vacina)”, admite HC – Álvaro Furtado Costa, Especialista em Doenças Infecciosas da FMUSP.
Gustavo Cabral, imunologista que liderou um estudo na USP e no Incor, concorda: “A vacina é a melhor forma de prevenir (prevenir), mas não é a única, existem tratamentos. Não existe vacina para o HIV, e a infecção Pessoas com o vírus podem levar uma vida normal. Sabemos que cerca de 80% das pessoas com Sars-CoV-2 não desenvolverão Covid-19 ou apresentarão sintomas leves. O problema são os outros 20% e o risco de morte, que é de 6 % hoje. Mas existem centenas de estudos sobre drogas agora”, disse ele.
encontrar uma vacina
Para obter uma vacina eficaz, os pesquisadores precisam passar por várias etapas para testar a segurança e as respostas imunológicas. Primeiro, há uma fase exploratória onde moléculas promissoras (antígenos) são estudadas e identificadas. O segundo momento é a fase pré-clínica, onde a vacina é validada em organismos vivos, utilizando animais (por exemplo, ratos). Só então chegará ao estágio clínico em humanos por meio de três estágios de testes:
Fase 1: avaliação inicial com acompanhamento de perto de um pequeno número de voluntários adultos;
Fase 2: Testado em centenas de participantes, indicando as informações de dosagem e horário a serem usadas na Fase 3. Os pacientes foram selecionados aleatoriamente (aleatoriamente) e bem controlados;
Fase 3: Ensaios em larga escala (com milhares de participantes) que exigem uma avaliação clara da eficácia/segurança e previsão de eventos adversos; só então os registros de saúde estão disponíveis.
Depois disso, os reguladores precisam aprovar o produto, liberá-lo para produção e distribuí-lo. Das dez vacinas testadas na fase clínica, algumas surgiram em fases mais avançadas, como a desenvolvida na Universidade de Oxford na terceira fase.
A vacina do Reino Unido é feita a partir de um vírus (ChAdOx1), uma versão enfraquecida de um adenovírus que causa resfriados em chimpanzés. O material genético usado para produzir a proteína spike SARS-Cov-2, que é usada para invadir células, é adicionado ao imunizador, que induz a produção de anticorpos.
A AstraZeneca assinou um acordo com os EUA e o Reino Unido para cuidar da produção globalmente. O executivo-chefe da empresa farmacêutica disse à BBC no domingo que 100 milhões de doses da vacina podem estar disponíveis já em setembro.
“Na verdade: uma vacina é possível em cerca de 18 meses devido aos investimentos no mundo. O mundo parou. Mas eu diria que só será possível em setembro”, pensa o brasileiro Gustavo Cabral (Gustavo Cabral).
Álvaro Furtado Costa também aconselhou cautela contra anúncios de vacinas excessivamente otimistas. Ele argumenta que não se pode ignorar, por exemplo, a novidade no campo que impulsiona a ação da empresa que a anuncia.
“Quando você inicia um estudo de vacina, você tem resultados muito preliminares e rápidos na Fase 1 para começar a avaliar se é seguro e se não tem efeitos colaterais graves, mas você testa muito poucas pessoas. Na Fase 2 e na Fase 3, você Estamos testando 10.000, 20.000 pessoas, e demora mais. Aí você vê se realmente protege. O mundo testou vacinas contra o HIV que chegaram ao estágio 3 e depois falharam. É preciso manter a calma”, disse Costa.
Iniciativa Brasil
Dois estudos realizados no Brasil aparecem na fase pré-clínica relatada pela OMS.
Um desses projetos é liderado por cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor). A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O pesquisador responsável pelo estudo, Gustavo Cabral, é imunologista da USP e pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Oxford e na Universidade de Berna, na Suíça. Seu grupo está trabalhando em plataformas de vacinas baseadas em partículas semelhantes a vírus (VLP). Os animais foram testados.
“Quando um vírus entra em nosso corpo, o sistema imunológico ataca. Não queremos usar um vírus, queremos usar partículas semelhantes a vírus. Fizemos isso com chikungunya, strep e agora Covid-19. Essas partículas são apenas uma base que estimula o sistema imunológico, e pegamos alguns fragmentos, fragmentos de proteínas ou proteínas inteiras do coronavírus e estimulamos o sistema imunológico a produzir anticorpos.”
Também em fase pré-clínica está a vacina em estudo pelo INCTV (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas), que tem embasamento técnico elaborado pelo Grupo de Imunologia de Doenças Virais da Fundação Oswaldo Cruz-MG.
“Nossa tecnologia envolve o uso do vírus influenza como carreador de vacina. Por ser um vírus com defeito reprodutivo, não causa doença, mas produz anticorpos. Por meio desse processo, uma possibilidade é desenvolver um vírus que possa ser usado para combater a gripe . e coronavírus”, explica o pesquisador Ricardo Gazzinelli, chefe do Grupo de Imunopatologia e coordenador do INCTV da Fiocruz Minas.